Como e por que medir a rentabilidade dos seus investimentos

Pode parecer incrível que aplicar uma fórmula matemática possa dar tanta margem pra confusão. É até escusável que o investidor iniciante não saiba aplicar o conceito, mas esse texto foi inspirado por serviços financeiros (sim, no plural) que mostravam retornos dos meus ativos que estavam totalmente diferentes das minhas planilhas e, mais importante, das minhas contas em bancos e corretoras! Ou seja, na maioria das vezes, a forma de usar a rentabilidade é confusa, inútil e/ou errada.

Confusão

O primeiro passo para esclarecer a rentabilidade é definir exatamente quais valores estão sendo usados. Você precisa do valor inicial e do valor final do investimento; mas é necessário saber se esses valores são líquidos ou brutos — o custo de aquisição do ativo entrou na conta? As taxas administrativas? O imposto de renda? Muitos ativos são isentos de IR, como eles se comparam com os que não são?

E quando uma corretora ou banco te dá uma rentabilidade esperada, qual o período que consideraram? Rentabilidade ao ano? Ou foi pelo período inteiro que aquele investimento existe? No caso de renda fixa, por exemplo, a rentabilidade mudou muito nos últimos anos e um fundo de mais de 5 anos de existência pode ter apresentado rendimentos altos em seu começo e rendimentos medíocres no presente. Note também que a maioria das corretoras e bancos só mostra o rendimento até 36 meses — muito curto para avaliar a performance, ainda mais considerando crises, trocas de governo, etc.

Considerando os critérios acima, não existe forma certa ou errada de calcular o retorno, mas é importante que você use a mesma régua para comparar todos investimentos. Então, fique atento aos critérios utilizados, sob risco de entrar na segunda armadilha:

Inutilidade

Medir o rendimento serve basicamente para que possamos escolher o melhor investimento naquele momento (ou, pra ser sincero, pra fugir de furadas). E isso é feito de um jeito muito simples: comparando o investimento com um benchmark.

Benchmark significa apenas algo que se usa para comparar outra coisa. Na prática, existem dois benchmarks úteis para mensurar nossos investimentos: a inflação, pois ficar abaixo dela significa perder dinheiro passivamente; e o investimento mais simples que você poderia fazer em cada classe de ativo.

A inflação, apesar de ser um comparativo óbvio, muitas vezes é esquecida (talvez de propósito) pois ela mostra como diversas indicações de bancos ou corretoras são ruins. Especialmente nos últimos tempos, com as taxas de juros baixas, diversos CDB, LCI, LCA, etc, (sem falar na Poupança!) estão dando retornos menores que a desvalorização da moeda! Na prática, você investiria nesses papéis pra perder menos do que deixar embaixo do colchão. É por esse motivo que indico sempre priorizar investimentos atrelados à inflação (geralmente IPCA) para evitar perder dinheiro na renda fixa como um todo (já que a reserva de emergência geralmente fica alocada em títulos de liquidez diária e esses não costumam ser atrelados ao IPCA).

O investimento mais simples em cada categoria serve como um ótimo benchmark para que você não perca seu tempo. O exemplo mais clássico é a bolsa de valores. É notoriamente difícil bater os índices das bolsas — como o Ibovespa ou o S&P500 — que medem a performance média dos papéis mais negociados. Você pode verificar isso facilmente ao pesquisar “fundos superam ibovespa” e algum ano. Geralmente menos da metade dos fundos bate o índice.

Fica pior: não são sempre os mesmos fundos que batem o índice — é o fenômeno estatístico da regressão à média, ou seja, às vezes as performances são muito altas ou muito baixas em um período, chamando a atenção dos desavisados, mas depois voltam ao normal. Assim, no longo prazo, quase todos acabam perdendo para o índice Bovespa (que pode ser facilmente replicado ao comprar um ETF como o BOVA11, que possui taxa de administração de 0,54% ao ano, ao invés de 2% a 4%, como a maioria dos fundos de ações).

Mesmo um grande selecionador de ações como Warren Buffet sabe como é difícil bater o mercado. Em 2017 ele ganhou uma aposta de 10 anos, em que apostou que dinheiro investido num fundo passivo (como um ETF que segue o índice) superaria uma cesta de pelo menos 5 fundos ativos. E não foi uma vitória apertada: o S&P500, índice que o fundo passivo seguia, acumulou retornos de 85% no período, contra apenas 22% da cesta de fundos! A fonte, em inglês: https://www.fool.com/investing/2020/02/27/the-1-thing-warren-buffett-wont-do-with-berkshire.aspx

E, pra terminar o argumento, um demonstrativo de fundos americanos e globais que superaram o respectivo índice (em azul) versus os que tiveram retorno menor (laranja) utilizando um período de 15 anos:

Na média, 85% dos fundos perdem para o índice de referência — cobrando taxas bem maiores

É importantíssimo ter um benchmark porque se o investimento mais simples de uma classe de ativos, seja renda fixa, variável, câmbio, bate um fundo ou uma estratégia ativa, então você pode estar perdendo tempo e dinheiro! Sempre considere qual é a forma mais simples de investir na média do mercado e verifique se aquilo vale mais a pena do que alguma tática mirabolante.

Mas lembre-se de sempre considerar como você investe na prática. Porque a maioria das formas de medir o retorno é

Errada no mundo real

Pergunte a qualquer um ou pesquise: qual foi o retorno da Bolsa em 2020? A resposta “oficial” é 2,96%. Mas esse número só importa se você investiu no primeiro dia útil de 2020 e nunca mais mexeu na sua carteira!

Todo investidor sério sabe: o segredo do sucesso financeiro é consistência. Se você investe uma vez no ano e em todos os outros meses gasta 100% do seu salário, pouco importa como você investe — você não terá sucesso. E 2020 foi a maior prova disso: uma estratégia simples de investir no BOVA11 uma vez por mês — ou seja, investir no Ibovespa,o mesmo índice que “rendeu” 2,96% no ano — daria um retorno de 23%!

Aportes mensais de R$ 2.000,00 vs aporte único de R$ 24.000,00

Esse tipo de estratégia permite aproveitar as quedas do ativo e mitigar um pouco sua volatilidade. Isso significa que numa alta constante seria melhor investir todo o capital no início do período — mas quase ninguém tem essa possibilidade no mundo real e absolutamente ninguém tem uma bola de cristal para saber se o ativo realmente vai ter uma alta constante.

Então o jeito que você investe, a sua consistência, importa muito na hora de medir o retorno do investimento. Pode parecer óbvio agora, mas muitos serviços profissionais de acompanhamento de carteira de investimento desconsideram aportes periódicos e te mostram uma rentabilidade ilusória — agora que você está pensando nisso, vai começar a enxergar esse tipo de cálculo por aí

(foi exatamente o que inspirou esse texto: uma carteira que comprou BOVA11 todos os meses era mostrada com o mesmo rendimento de comprar apenas uma vez no começo do ano. Entrei em contato com a área técnica do serviço e me responderam que era um forma de cálculo de cotização diária e taxa interna de retorno e blablabla… só que o resultado no meu bolso seria o rendimento de 23% descrito acima, e não o de 2,96% que o serviço mostrava)

Outra visão interessante é do rendimento de todos os seus investimentos em conjunto. E existe uma comparação que também vai te economizar tempo e dinheiro: se você já investe em renda fixa e na bolsa, o rendimento da sua carteira provavelmente vai ser muito parecido com o de quase todos os fundos multimercado. Ou seja, investir nesses fundos vai aumentar o seu risco total, pois eles costumam ser um tanto voláteis, mas não vão mudar muito o seu rendimento, pois serão redundantes com o que você já está fazendo (e, novamente, cobrando taxas altas para isso e limitando a entrada e saída de capital — influenciando na sua consistência e alocação de ativos).

CDI (preto) e Ibovespa (vermelho) e o fundo multimercado Moat (azul) quase servindo de média

(isso demonstra, também, a importância de buscar ativos não correlacionados. Note que os fundos multimercado se movem junto com a bolsa. Então não são eles que vão amortecer sua carteira numa época de crise)

Não é que os bancos, corretoras, especialistas e influencers estejam errando na matemática — apenas que o jeito de mensurar esse tipo de coisa deve ser diferente para uma pessoa física, agindo com suas restrições e incentivos específicos. Imagine alguém que está querendo investir em bolsa ao ver um rendimento pífio de 2,96%, pior que renda fixa… imagine como esse tipo de medição influencia o modo como as pessoas pensam em seus investimentos, como algo que se coloca dinheiro uma só vez e depois só torce para dar certo…

Portanto, lembre-se sempre de medir tudo o mais próximo possível de como as coisas são no mundo real. Isso significa, na maioria das vezes, medir quanto dinheiro saiu do seu bolso ao longo de um período e quanto dinheiro voltaria se você vendesse seus ativos naquele momento. A partir daí, uma simples regra de 3 ou a fórmula “(valor final / valor inicial) -1” vai te mostrar a rentabilidade. E você vai estar na frente de quase todos os outros investidores ao se proteger de investimentos que só fazem você perder tempo ou dinheiro — e, como nosso foco é no longo prazo, isso pode fazer uma diferença tremenda em 5, 10, 20 anos!

PS: Se quiser conhecer meu método para investir levando tudo isso em consideração, clique aqui