Investimento em Valor como proteção contra a inflação

Um clássico nacional é temer a inflação; mesmo após o Plano Real, de tempos em tempos temos essa taxa aumentando. E até quando a inflação está baixa em termos brasileiros, ela (assim como nossos juros) ainda é muito maior do que a média de países desenvolvidos — e a renda fixa fica atraente para investidores locais e estrangeiros. Mas é preciso ter cuidado para realmente estar obtendo rendimentos reais, acima do aumento de preços; a SELIC e o CDI, que indexam a maior parte dos investimentos em renda fixa, não andam sempre juntos com IPCA e o IGPM. E mesmo assim, a maioria dos investidores não quer depender apenas de opções conservadoras.

Mas será que vale a pena manter investimentos em imóveis, câmbio, ações, criptomoedas, num cenário de alta inflação, geralmente acompanhado de incertezas e volatilidade?

O que NÃO está funcionando

Como sempre, vale a pena analisar dados históricos primeiro e tentar encontrar uma lógica depois (que é o contrário do que a maioria dos analistas faz, tentando torcer a realidade para encaixar em suas convicções). A lógica diria, por exemplo, que fundos imobiliários teriam boa performance em épocas de alta inflação — o valor dos imóveis e dos aluguéis costumam acompanhar ou até ultrapassar os índices oficiais. Mas não é o que estamos vendo no IFIX em 2021, que está com uma tendência de baixa leve.

IFIX sambando há 12 meses

Quem apostou em ações ligadas a energia ou ao setor consumo (que inclui farmácias, alimentos e cerveja) também não teve uma vida fácil — até agora, pelo menos). Pra onde correr, então, para evitar ver seu capital minguando aos poucos (lembrando que o IPCA nos últimos 12 meses já passa dos 10%)?

IEE na B3

ICON na B3

A solução em uma parte específica da renda variável

Felizmente, essa questão já foi respondida com análise de dados há cerca de 20 anos. O site Efficient Frontier publicou uma análise no começo dos anos 2000, replicada há pouco pelo Euclidean Investor, investigando a performance histórica de ações de valor contra ações de crescimento em cenários de inflação alta e baixa.

A relação da inflação e da performance de ações de valor — Gráfico feito pelo site Euclidean Investor

O gráfico acima mostra uma regra geral de que, quanto mais alta a inflação, melhor a performance de ações de valor.

Vale a pena uma observação sobre essa classificação, muito usada nos Estados Unidos mas não tão comum por aqui. Ações de valor são aquelas em que o valor patrimonial das empresas é grande comparado com o valor em que elas estão sendo negociadas na bolsa. Ou seja, são ações “baratas”. É o método de investimento de Benjamin Graham e Warren Buffet. Já ações de crescimento são aquelas que mostram potencial de gerar muita renda no futuro. E é aí que aparece o provável motivo de ações de valor performarem bem com a alta da inflação.

A inflação é uma expectativa de desvalorização do dinheiro no futuro. Ou seja, R$100 hoje valem mais do que R$100 reais amanhã. Ao separar ações de crescimento e ações de valor, o que é feito, basicamente, é distinguir ações que estão gerando dinheiro hoje (ações de valor) de ações com expectativa de gerar dinheiro no futuro (ações de crescimento). Assim, se o dinheiro hoje vale mais que o mesmo dinheiro amanhã e, como já dito, a inflação geralmente acompanha tempos incertos, a sabedoria implícita do conjunto de investidores acaba dando preferência a empresas que estão dando lucros agora.

Claro, isso é uma análise de dados do passado e a explicação é apenas uma hipótese. No entanto, investir é incerto por natureza. O que resta ao investidor racional é escolher aquelas estratégias com maior probabilidade estatística de sucesso. A relação entre inflação e valor é um ótimo (e relevante) elemento para guiar os investimentos na época atual.

Observação: outros ativos

O ouro é geralmente tido como uma das melhores proteções contra a inflação. No entanto, seu preço desvalorizou cerca de 8% nos últimos 12 meses (dependendendo do quê especificamente você comprou e em qual moeda).

Contratos futuros de ouro

Esse e outros motivos fizeram o gestor de fundos Paul Tudor Jones afirmar recentemente que prefere o Bitcoin ao ouro para se proteger da inflação, revelando que possui “um dígito” de seu portfólio alocado na criptomoeda.

A própria natureza do Bitcoin é uma defesa contra a inflação: existirá um número limitado da moeda, pela fórmula em que ela é baseada é impossível criar mais — ao contrário do que está sendo feito com as moedas tradicionais. No entanto, a intenção desse texto era analisar dados históricos. O Bitcoin ainda é uma aposta — ótima, mas uma aposta. A decisão de Tudor de alocar entra 1% e 9% de seu capital na moeda, porém, vem se mostrando uma ótima maneira de bater a inflação (assim como a maioria dos investimentos tradicionais).

Na prática

O que fazer, então? Escolher com cuidado a alocação de ativos da sua carteira, buscar ações de valor (VPA/P alto) e realizar aportes constantes nessas ações e em criptomoedas, especialmente quando estiverem em baixa.

Eu fiz alguns algoritmos para mim para facilitar essa busca de ações e criptomoedas. Você pode conhecer mais sobre eles aqui.

Também criei um curso sobre alocação de ativos para quem quer dominar essa técnica de uma vez por todas.

Se você ainda está começando, fiz um guia gratuito para começar a investir bem hoje.

Cuidado com a inflação e bons investimentos!